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A cidade preta, a cidade branca

Na historiografia de Joanesburgo, a segregação das pessoas por raça surge como uma tendência duradoura, estruturante na produção do espaço ao longo dos 120 anos que a cidade tem de existência oficial. Sua trajetória urbana começou em 1886, com a descoberta do ouro. No começo do século 20, os acampamentos de exploradores haviam se transformado em aglomerados de barracos de madeira, metal e tijolos. Estabeleceu-se dessa forma a gênese de Joanesburgo como cidade.


Desde que os europeus se instalaram, no século 16, “na ponta meridional do continente africano, tomou forma um processo de formação, confrontação e exclusão racial” (BLASER, 2010). O apartheid como lei passou a vigorar na África do Sul em 1948 – passo decisivo na separação sistemática de negros e brancos no país. Mas já antes disso, em 1903, o distrito de Soweto começou a ser formado como parte de um processo racista de expansão urbana.


O então bairro de Kliptown foi criado para moradia da população negra que trabalhava em minas e indústria no distante centro da cidade – são 25 quilômetros de distância. O acrônimo Soweto foi oficialmente adotado em 1963 para nomear a área de South Western Townships (“distritos do sudoeste”).


Duas vizinhanças do Soweto. Maio/2015. Fotos Mônica N. Florindo


Os problemas do Soweto, que hoje abriga 1 milhão de habitantes, um quarto da população total de Joanesburgo, desde então incluem habitações precárias, superpopulação, falta de infraestrutura e altas taxas de desemprego.


Outros bairros têm seu desenvolvimento naquele período desenhado pela segregação racial, que moldou uma Joanesburgo negra, periférica e empobrecida, e outra branca, central e mais rica. O histórico Hillbrow contraria tal divisão geográfica apenas no aspecto da localização no território. Está no centro, é negro, pobre e violento; ao mesmo tempo, vai se tornando um hub de diversidade cultural e acolhimento de parcelas discriminadas da população, como os homossexuais.


Na cidade branca, ruas residenciais arborizadas convivem com aglomerados empresariais e financeiros em bairros como Melville e Rosebank. São investidores e administradores brancos que hoje conduzem o projeto Maboneng Precinct, que está transformando os galpões do bairro industrial de Maboneng, colado à ferrovia, em uma área de galerias de arte e moda, restaurantes, hotéis e vida noturna. O Maboneng renovado e seu mercado de Arts on Main inflacionaram os aluguéis e estão matando pequenos comércios.


A Copa do Mundo de futebol de 2010, realizada na África do Sul, teve papel decisivo na consolidação de Joanesburgo como uma metrópole inserida no modelo dominante do capitalismo global atual, que faz dinheiro e concentra riqueza por meio da especulação, mais que da produção. O estádio Soccer City, no Soweto, de 1940, foi ampliado. Moradores relataram que, nos dias de partidas, parte do bairro ficava sem energia elétrica por sobrecarga na rede.


O bairro de Sandton, ao norte, levou a cidade branca para o anel periférico. Trata-se de uma fortaleza de shopping centers, escritórios e hotéis. Para chegar lá, construiu-se um ramal de trens desde o aeroporto. As vias para carros são largas e de velocidade mais alta. O transporte público é ineficiente.


Referências


BLASER, Thomas et al . "Raça", ressentimento e racismo: transformações na África do Sul. Cad. Pagu, Campinas, n. 35, p. 111-137, dez. 2010. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-83332010000200005&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 23 set. 2016. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-83332010000200005


LEPETIT, Bernard. Por uma nova história urbana. São Paulo, Edusp, 2001


The making of Soweto. Disponível em http://www.joburg.org.za/index.php?option=com_content&view=article&id=920&catid=88&Itemid=159, acesso em 22 de setembro de 2016




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